1. Introdução
Vivemos hodiernamente
O que denominamos de crise dos operadores
do Direito pode ser definida brevemente como a deficiência generalizada do
ensino brasileiro em seus três níveis, agravada pela massificação dos cursos
universitários e a proliferação irresponsável dos chamados campus que
representam nada menos do que a inaceitável mércia ao desserviço cultural,
tendo em vista o despreparo e ausência de titulação do corpo docente,
inexistência de bibliotecas criteriosamente elaboradas e a falta de visão
crítica do professorado a respeito de questões sócio-políticas, filosóficas e
históricas da ciência jurídica, acarretando a desqualificação dos nossos
futuros bacharéis em Direito.
Lamentavelmente, os professores, em sua
grande maioria, transformaram-se em singelos repetidores de idéias clássicas
(não raro até ultrapassadas) e de pouca utilidade nesta virada de milênio;
tornaram-se preparadores de estereótipos tecnocratas forenses ou, talvez
melhor, servos do sistema nomo-empírico prescritivo que, brevemente, passarão
apenas a operar o direito positivo, sem refletir criticamente a respeito da
ciência jurídica.
Por sua vez, a crise do Judiciário decorre
basicamente da desproporção brutal entre o elevadíssimo número de demandas e o
insignificante número de Magistrados em todos os graus de jurisdição, o que se
agrava com a malsinada cultura recursal difundida desde os bancos acadêmicos,
como se fosse a única maneira de se encontrar a verdade real e processual
(certeza jurídica em processo de cognição) e, conseqüentemente, a decisão
justa, quando sabemos que é propriamente o inverso que se verifica na prática,
tendo em vista que o processo produz versões.
Essa circunstância torna-se ainda mais
grave quando somada ao deficiente sistema de recrutamento dos juízes, a
problemática formação universitária desses candidatos (e serão eles os futuros
magistrados), os serventuários desqualificados e os parcos recursos financeiros
disponíveis para viabilizar um aparelhamento adequado e remuneração condizente
com as respectivas funções de seus membros e funcionários. Como se não
bastasse, ainda tremula a preocupante e enganosa bandeira do censurável
"controle externo da magistratura" ...
Finalmente, a crise do sistema legislativo
pode ser sintetizada através do incomensurável número de normas federais,
estaduais e municipais, somando-se às desmedidas portarias, circulares e ordens
de serviço, que, em conjunto, transformam-se em insegurança jurídica e ameaçam
o próprio estado democrático de direito. Como se não bastasse, o executivo
passou a legislar proporcionalmente muito mais do que o próprio Poder
Legislativo; por sua vez, este último limita-se a ratificar as normas editadas
"provisoriamente" pelo Executivo ou a criar leis comprometidas com os
interessas das classes dominantes ou decorrentes de promessas de palanque
eleitoral.
Dentro desse último contexto legislativo,
podemos ainda pinçar a crise do processo civil que decorre do não
comprometimento do Código de 1973 com a efetividade do instrumento e a
satisfatividade rápida das pretensões dos jurisdicionados através da realização
do direito material. Em outras palavras notadamente antes das últimas reformas
introduzidas no Código de Processo Civil -, possuíamos um Código
"tecnicamente perfeito", porém, inviável em termos práticos.
Com muita acuidade, nesse mesmo diapasão,
assim se manifestou o Professor Francisco Rezek: "Há no Direito
brasileiro dois vícios graves pedindo, já faz tempo, remédio urgente. Nossas
regras de processo, antes de tudo, parecem não querer que o processo termine.
Os recursos possíveis são muitos (creio não haver fora do Brasil trama
recursiva tão grande e complicada), e pouca gente hoje crê que isso ajude mesmo
a apurar melhor a verdade para melhor fazer justiça. (...) Depuradas com
coragem as regras de processo, moderada a fecundidade com que se produz o
direito material e melhorada sua qualidade (ainda que pela só opção dos
caminhos simples), nada mais seria preciso para superar a crise do nosso
Direito, de que a da Justiça é mero subproduto. Isso não pede mais que algum
trabalho, método e consciência do legislador. Não cresce, nessa reforma, a
despesa pública." E arremata o ex-ministro, hoje juiz da Corte
Internacional de Justiça, em Haia: "Depender do socorro da Justiça, com
tudo o que isso exige em matéria de dispêndios, energia e paciência, pode ser
mero contratempo na agenda de um norte-americano médio. E uma brutalidade no
caso de um brasileiro comum. Apesar de tudo, é algo que se banaliza e invade o
cotidiano dos nossos cidadãos mais modestos, íntegros, organizados e amantes da
paz. No entanto, não me parece fantasioso ou delirante pretender que uma pessoa
de bem possa, em princípio, atravessar sua vida sem jamais se envolver em
conflito de relevo, sem precisar, assim, contratar advogados e bater à porta
imprevisível do foro. A situação que vivemos é patológica, e é puro cinismo
pretender vendê-la ao público como normal, saudável, quem sabe como prova de
vitalidade da democracia pluralista." (grifei).[1]
Por outro lado, os sistemas legislativos
originários de civil law herdaram a parte menos nobre do direito romano ou,
melhor, do direito romano decadente de influência cristã bizantina, razão pela
qual podemos afirmar que o nosso processo civil não é romano, mas sim
romano-canônico, significando dizer que absorvemos o regime da actio que, por
sua vez, era decorrente da obbligatio, terminando por gerar a condemnatio
(sentença de mera exortação), enquanto os inlterdictus (tutela ad interdictum)
passaram em sua pureza e inteireza para os sistemas denominados de common law,
onde o julgador - assim como fazia o preto r romano ordena e autoriza, sob
pena de imposição de alguma sanção (medidas coercitivas) e desobediência.
Portanto, herdamos um processo civil romano
que sofreu sensivelmente os influxos do direito canônico e medieval, culminando
com o agravamento do liberalismo e iluminismo dos séculos XVIII e XIX, onde
mais do que nunca o juiz se fez passar tão-somente como a "boca da
lei" mercê de ingênua imparcialidade e eqüidistância dos litigantes, assim
como a jurisdição limitou-se ao acertamento e declaração do direito,
dissociando-se da execução ou qualquer medida coercitiva para não violar os
princípios orientadores da época das luzes.[2]
Com o advento da jovem ciência processual
civil em meados do século passado formaram-se as regras norteadoras do chamado
processo "clássico"; muitas dessas regras transformaram-se em
princípios e estes em dogmas tendentes a eternizar-se. Se por um lado a
autonomia e a afirmação da ciência processual foram um marco e uma necessidade
na história do Direito, de outra parte, tornaram-se, durante mais de cem anos,
um verdadeiro obstáculo para a realização do direito material, à medida que,
paulatinamente, o processo civil desprezou a instrumentalidade para fazer-se um
fim em si mesmo, em detrimento dos próprios jurisdicionados e da paz social.
Nesse ínterim, criaram-se muitos dogmas e
não poucos mitos ... Dentre eles, interessa-nos mais diretamente a crença na
busca da verdade através de um processo de conhecimento fundado na
ordinariedade e matizado por cognição plena e exauriente a desaguar numa
sentença condenatória com o escopo de criar um título judicial revestido de
liquidez, certeza e exigibilidade, a fim de justificar um processo de execução
por sub-rogação e, finalmente, atingir a satisfatividade do vencedor da
demanda.
Vivemos, portanto, durante praticamente
dois mil anos, sob o jugo do princípio mitológico da nulla executio sine
titolo, enquanto as suas raríssimas exceções estampadas em típicas ações
mandamentais e executivas lato sensu (v. g. ações possessórias de força nova,
despejo, reivindicatória, mandado de segurança) eram justificadas como
integrantes de uma obsoleta classificação ternária onde apareciam circunscritas
às malsinadas demandas "condenatórias", sendo que a executividade ou
a mandamentalidade não passavam de um simples exaurimento no plano fatual da
satisfatividade conferida na condenação ao vencedor. Em outros termos, o
injustificável restava inexplicável...
A verdade é que as ações mandamentais assim
como as executivas lato sensu perambulavam pelo cenário jurídico sem que os
cépticos "clássicos" admitissem a sua existência e autonomia como
integrantes de uma subdivisão das ações de conhecimento, notadamente em razão
do silêncio tumular do nosso Código Instrumental que absorveu de maneira cega
a teoria italiana do início do século e mais recentemente de Liebman.
Não se pode negar também que,
lamentavelmente, o processo civil clássico procurou sufocar (em vão) a
existência da ação de direito material em prol de uma pseudo-pureza da nova
ciência processual e quiçá da própria e então emergente teoria eclética das
ações, como se elas fossem absolutamente incompatíveis entre si.
Esquematizou-se, assim, uma "classificação das ações" fundada
exclusivamente em critério instrumental que resultou no desacerto, por
décadas, da admissibilidade apenas de demandas cognitivas modeladas pela
ordinariedade e que gerariam sentenças declaratórias, constitutivas e
condenatórias, convivendo ao lado das acautelatórias e executivas stricto
sensu.
Essa concepção teorizada, além de desprezar
a classificação quinária das ações (que acrescenta as mandamentais e executivas
Lato sensu), ignora de plano as relações de direito material que haverão de
originar as respectivas tutelas jurisdicionais diferenciadas e efetivamente
sintonizadas com a pretensão articulada e a satisfação perseguida, ou seja, a
necessária adequação da ação de direito material à "ação"
processual.
Afigura-se-nos a formulação de uma
classificação diversa das "ações" tomando-se como ponto de partida e
critério a tutela jurisdicional perseguida e baseada na respectiva relação de
direito material sobre a qual incidirá a proteção pleiteada. Nessa seqüência,
classificamos as ações da seguinte forma: a) declaratória; b) constitutiva; c)
ressarcitória; d) recuperatória; e) vindicatória; j) inibitória; g) acautelatória;
e h) executiva stricto sensu.
Para concluirmos essa fase introdutória de
nosso estudo, assinalamos que até o advento da Lei 8.952/94 que instituiu para
o processo de conhecimento de rito comum a viabilidade jurídica de obtenção de
tutela jurisdicional antecipada genérica e específica, vivíamos a doce ilusão
baseada na crença mitológica e milenar da impossibilidade de se obter
satisfação (execução) enquanto não produzíssemos um título judicial hábil a
ensejar um processo executório (execução de sentença condenatória).
Desta feita, as chamadas ações sincréticas
cada vez mais se avultam e passam a criar notoriedade - agora mais recente -
através da excelência do 13.º Anteprojeto de Lei de reforma do CPC e outras
providências (também chamado de Base XIII), definido em reunião da Comissão
coordenada pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual e Escola Nacional
da Magistratura, realizada em Salvador, em novembro de 1998, mormente no que
se refere à nova redação dos arts. 273, 461, 621 e 644, além da incursão de um
novo dispositivo - o art.
Todavia, como o sistema ainda se funda na
classificação ternária das ações, e, portanto, ignora a existência das ações
mandamentais e executivas lato sensu, alguns problemas de não pouca
complexidade exsurgem desta concepção, valendo ressaltar apenas a questão
relativa aos embargos de retenção assegurados ao possuidor de boa-fé em face
das benfeitorias úteis e necessárias por ele realizadas, nos termos do
disposto no art. 516 do CC e em confronto com o art. 744, caput, do CPC, in
verbis: "Na execução de sentença, proferida em ação fundada em direito
real, ou em direito pessoal sobre a coisa, é lícito ao devedor deduzir também
embargos de retenção por benfeitorias."
Em outros termos, a inserção do problema
que formulamos é a seguinte: Como equacionar a natureza jurídica das ações de
reintegração de posse de força nova (e outras ações sincréticas) com as regras
de direito material pertinentes à retenção por benfeitorias necessárias e
úteis?
2. Algumas considerações sobre as ações
sincréticas
Denominam-se ações sincréticas todas as
demandas que possuem em seu bojo intrínseca e concomitantemente cognição e
execução, ou seja, não apresentam a dicotomia entre conhecimento e
executividade, verificando-se a satisfação perseguida pelo jurisdicionado numa
única relação jurídico-processual, onde a decisão interlocutória de mérito
(provisória) ou a sentença de procedência do pedido (definitiva) serão
auto-exequíveis.
Há muito pouco tempo, falar na doutrina brasileira
em remédio jurídico de natureza sincrética significava, de certa maneira, uma
afronta aos princípios do processo civil clássico ancorado na nulla executio
sine titolo e, conseqüentemente, na irreparável cisão entre cognição e
execução. Mutatis mutandis, era um risco permanente de subversão a um
"dogma" pelo qual a Santa Inquisição fatalmente condenaria os seus
defensores ao fogo eterno e execração em praça pública.
Não foi por menos que o culto Professor
Ovídio Baptista da Silva assinalou que "A avassaladora ideologia que se
oculta a afirmação, hoje incontroversa em doutrina, da inconciliabilidade entre
cognição e execução, pode ser vislumbrada nesta passagem de Liebman, em que ele
procura mostrar que a atividade judicial, no processo de conhecimento, é
'prevalentemente de caráter lógico', ao passo que, no processo de execução, tem
ela o caráter de 'operações práticas', tendentes a efetivar a 'regra jurídica
sancionadora', indicada pela sentença. Escreve o jurista (op. cit., n. 18): A
posição jurídica das partes também é diferente. Na cognição elas estão em
posição de equilíbrio, pois não se sabe qual delas está com a razão e nada pode
ser feito sem que todas elas sejam ouvidas ou possam fazer-se ouvir, de acordo
com o princípio do contraditório (o original não está grifado): todas operam,
cada uma no sentido do próprio interesse."
E prossegue o Mestre gaúcho: "É fácil
perceber que Liebman confunde 'processo de conhecimento' com procedimento
ordinário, pois somente nesta espécie de jurisdição cognitiva 'nada pode ser
feito' pelo magistrado sem a prévia audiência das partes. Como explicaria ele -
e toda a doutrina formada a partir de Chiovenda - a mistura entre cognição e
execução nos procedimentos especiais portadores de liminares, como sucede, por
exemplo, com nossos interditos possessórios e com o mandado de segurança, onde
'tudo pode ser feito' sem que o réu seja ouvido previamente, e onde a execução
mistura-se com a cognição e até mesmo a precede?"
"... O equívoco fundamental da doutrina
da separação entre conhecimento e execução é ter exagerado tanto ao pressupor
que, no processo cognitivo o magistrado nada possa fazer, porque tudo lhe é
desconhecido e sobre todas as questões existem controvérsias, de modo que
faltem elementos de convicção para prover, mesmo provisoriamente, no curso da
demanda; quanto o ter exagerado, também, ao supor que o título executivo seja a
expressão inequívoca do direito de crédito que ele, num dado momento,
representou." (grifei).[3]
O Professor Humberto Theodoro Jr.,
Lança, então, o festejado Professor mineiro
a seguinte indagação: "Sendo certo que o fim do processo é a composição
efetiva da lide, poder-se-ia admitir, in casu, como cumprida a função
jurisdicional, de tal maneira a dar-se por definitivamente encerrado o
processo, apenas com a prolação da sentença condenatória?" E responde:
"Uma vez que, no procedimento condenatório, a sentença contém comando no
sentido de impor ao vencido a realização da prestação reclamada pelo vencedor,
e porque ninguém pode garantir que aquele vai cumprir espontaneamente a
condenação, é forçoso concluir que, mesmo após o encerramento formal desse tipo
de processo, ainda subsiste a lide primitiva envolvendo as partes. Só mesmo a
realização da condenação terá a força de eliminar do cenário jurídico o
litígio, nessas circunstâncias, como é intuitivo." [4]
Mais adiante, ao fazer o que denominou de
balanço das vantagens da unificação dos procedimentos condenatório e
executivo, escreve com propriedade, nos seguintes termos: "E razão não há
para persistir na manutenção de uma autonomia da execução de sentença que não
se justifica, nem no plano lógico, nem no jurídico e muito menos no
econômico." (...) "a) a pretensão que justifica a falsa dissociação
em pretensão de condenar e pretensão de executar. Na realidade, só há uma
pretensão: a de compelir o devedor à prestação sob inadimplência; b) se a lide
real não se compõe apenas com a sentença condenatória, tem o órgão judicial,
para atingir o desiderato da pacificação social, que prosseguir através de atos
que tornem efetiva a restauração da ordem jurídica violada; c) se a condenação
não basta para pacificar a lide, e necessária ainda se faz a atuação executiva,
razão não há para encerrar-se a função jurisdicional com a sentença de mérito e
exigir que o credor proponha outra ação para levar o órgão judicial a executar
sua própria ordem de condenação; (...) e) na verdade, a execução, como
processo autônomo e completo, só se justifica na cobrança dos títulos
extrajudiciais, porque equiparados à sentença, dispensam a fase de cognição e
já autorizam o início da atividade jurisdicional no estágio da realização
prática do direito do credor, sem perder tempo com a sua definição ou
acertamento.
E arremata: "É, pois, a nosso ver,
hora de se pensar em maior profundidade, para através de medidas aparentemente
singelas, penetrar na própria estrutura do nosso sistema processual, dele
extirpando reminiscências de romanismo anacrônico, que não correspondem,
evidentemente, aos atuais anseios de maior valorização e mais presteza da
atuação jurisdicional.”[5]
E como veremos a seguir, é justamente nessa
linha de pensamento que de maneira gradativa, porém sensível, vêm avançando as
reformas do nosso Código de Processo Civil, que passa a reconhecer a
classificação quinária das ações e o inarredável sincretismo entre cognição e
execução, como fórmula de minimização da incidência do fator tempo no processo,
em harmonia com os valores não menos importantes e representados pela segurança
do juízo por intermédio do due process of law e da incessante busca da decisão
justa. Rompem-se, desta feita, as barreiras do processo civil clássico e
institui-se paulatinamente um instrumento de resultados e efetivamente voltado
à realização do direito material.
3. As reformas já instituídas e as futuras
modificações do Código de Processo Civil fundadas no amálgama da cognição com
execução
Certamente o marco da cruzada reformista
liderada por Sálvio de Figueiredo Teixeira reside na aprovação do Projeto que
originou a Lei 8.952, de I3 de dezembro de 1994 e, dentre outras modificações,
instituiu os regimes de tutelas antecipatórias genéricas (art. 273) e
específica (art. 461), rompendo assim o princípio mitológico da nulla executio
sine titolo e, somando-se a alguns procedimentos especiais sincréticos (v. g.
possessória, mandado de segurança, busca e apreensão fundada em alienação
fiduciária etc.) a possibilidade jurídica de se obter em processos cognitivos
de rito comum através de decisão interlocutória de mérito de natureza
satisfativa e provisória (interinal satisfativa no plano fatual) os
"efeitos práticos da tutela pretendida", ou seja, simultaneamente
execução e cognição sumária e limitada, baseada em juízo de verossimilhança.
Se por um lado a novidade a muitos
empolgou, por outro, apresentou-se ainda deficitária, porquanto em conflito com
o próprio sistema codificado e com os princípios do processo civil clássico, à
medida que se mantinha sustentada pelo processo de conhecimento norteado pelas
ações condenatórias, pela inexistência de um regime efetivo de execução
provisória e pelo regramento do duplo efeito conferido aos recursos de
apelação, acarretando perplexidade ao operador do direito que, de maneira
ilógica, "podia o mais" (satisfação provisória no mundo dos fatos
através de tutela antecipada), mas não "podia o menos" (satisfação
mediante execução provisória fundada em sentença de procedência impugnada).
Acrescente-se ainda a verificação de regimes distintos de antecipação de
tutela, o que causou inúmeras dificuldades práticas, tendo em vista a zona
cinzenta estabeleci da entre as duas formas de tutela (genérica e específica).
E a dúvida permanece: como se executa, ou seja, qual o regime jurídico
aplicável à antecipação de tutela genérica? Como se não bastasse, omitiu-se a
respeito da antecipação de tutela para as demandas que tivessem por objeto a
entrega de coisa ...
Assim, a incursão da tutela antecipada
revelou claramente a distinção feita pela doutrina processual tradicional entre
tutela (outorgada pelo processo de conhecimento) e efeitos da tutela (únicos
capazes de serem antecipados). Em outras palavras, o art. 273 do CPC deixa à
mostra a impossibilidade total do processo de conhecimento - enquanto tutela
ordinária - de produzir tutela antecipada. "Como se vê, a lei separa
nitidamente a tutela de seus efeitos, prevendo que o magistrado somente poderá
antecipar algum efeito, nunca a tutela pretendida no pedido inicial. Figuremos
então um exemplo. Imaginemos que o autor esteja a promover uma ação de
reintegração de posse. Que seria, nesta ação, a tutela pretendida pelo autor, e
quais os seus efeitos, capazes de serem antecipados?"
"Para a doutrina tradicional, a tutela
será sempre aquela prestada pelo Processo de Conhecimento, reduzida à
declaração e à constituição, contidas na sentença de mérito. Estas formas de
tutela não poderiam ser antecipadas, como juízos definitivos de certeza,
porque, evidentemente, os provimentos que os contivessem não seriam
simplesmente antecipações, ou liminares, mas julgamentos definitivos e finais.
Teríamos, então, em, nosso exemplo, que a tutela pretendida pelo autor, na ação
de esbulho possessório, não seria a recuperação da posse, eventualmente
ordenada pelo provimento liminar antecipatório, e sim a simples declaração de
que houvera esbulho e que ele, autor, tinha direito à recuperação da posse.
Tutelar a posse corresponderia, na ação de esbulho possessório, a proclamar em
sentença final de mérito, que o autor tem direito à restituição da coisa,
perdida em virtude do esbulho. A entrega efetiva da coisa, o ato jurisdicional
executivo, assim como a ordem, nas ações mandamentais, seriam, para a doutrina
tradicional, apenas 'efeitos da tutela', ou como diria Alfredo Buzaid, simples
posterius do ato jurisdicional típico, que seria a declaração do direito, ou no
máximo a declaração a que se adiciona a constituição, nas sentenças
constitutivas. Em última análise, o ato jurisdicional será sempre no Processo
de Conhecimento, nunca em suas conseqüências práticas ocorridas no processo
executivo." [6]
Nada obstante a esses conflitos e
obstáculos naturais enfrentados pelo movimento reformador do Código de
Processo Civil[7] os frutos até aqui colhidos são positivos e o 13.°
Anteprojeto de Lei promete muito mais, à medida que procura corrigir distorções
apontadas pela doutrina no que tange aos regimes de antecipação de tutela
genérica e específica, assim como prestigia o sincretismo das ações, mesclando
e reunindo cognição com execução.
A esse respeito assinala o Ministro Sálvio
que "Expressivas igualmente são as inovações no processo executivo,
justificadamente um dos pontos mais criticáveis da nossa legislação."
"A Reforma, com a introdução do
procedimento monitório (Lei 9.079/95) e com a Lei 8.953/94, já vinha buscando
modernizar a execução civil brasileira. Agora, com o novo anteprojeto, vai
além, dando um passo largo na concretização desse objetivo.''
"Com efeito, o que se propõe é a
supressão do processo executivo autônomo, em se tratando das obrigações de dar
coisa, certa ou incerta, e das obrigações de fazer ou de não-fazer, o que
importa dizer que, nessas modalidades de obrigações, em se tratando de título
judicial (sentença), a execução será uma simples fase, sem possibilidade de
embargos do devedor, a exemplo do que ocorre hoje com as ações possessórias,
com as ações de despejo e com a ação de nunciação de obra nova. Dá-se aí, um
'processo sincrético', no qual se fundem cognição e execução (arts. 461 e 461A,
621 e 644)." (grifei).[8]
Nesse diapasão, o 13.° Anteprojeto além de
ser vanguardista, procura também corrigir várias distorções apontadas pela
doutrina. Vejamos, então, rapidamente, algumas dessas modificações: 1.º)
arregimenta-se a tutela antecipatória genérica com a específica, facilitando o
seu manejo prático voltado à busca da efetividade do processo[9]; 2.°)
admite-se com base no princípio da proporcionalidade a concessão de tutela
antecipada, excepcionalmente, em se tratando de providência irreversível;[10]
3.°) redimensiona-se o espectro da chamada "ação cominatória"
enquadrando-a aos parâmetros da antecipação de tutela específica;[11] 4.°)
amplia-se a incidência das astrentes para as hipótese de efetivação da tutela
específica ou obtenção do resultado prático equivalente, em se tratando de
demanda que versa sobre obrigação de fazer ou não fazer;[12] 5.º) cria-se a
tutela específica para as obrigações de entrega de coisa;[13] 6.º) institui-se
como regra o recebimento da apelação no efeito devolutivo;[14] 7.º) altera-se o
regime da execução provisória;[15] 8.º) modifica-se o regime da execução para a
entrega de coisa;[16] 9.º) alteram-se as disposições gerais da execução das
obrigações de fazer e de não fazer;[17] 10.º) modifica-se a sistematização e
altera-se a redação dos embargos de retenção por benfeitorias.[18]
5. O direito de retenção por benfeitorias
diante do problemático e atual sistema do Código de Processo Civil
Outro aspecto que merece ser enfocado diz
respeito às tutelas antecipatórias interditais concedidas em ações possessórias
de força nova[19] e seus consectários ou em demandas também sincréticas de
outra natureza que envolvam a recuperação, busca e apreensão ou imissão de
posse (dependendo do objeto em questão ser móvel ou imóvel) no que concerne ao
direito de retenção por benfeitorias necessárias e úteis (art. 516, CC) por
parte do sujeito passivo da demanda que até então se enquadrava no perfil de possuidor
de boa-fé.[20]
Ocorre que nas demandas interditais em que
se verifica a concessão de liminar, a sua executividade no âmbito do mundo
fatual se dá de plano ou após intimação da parte contrária que, por sua vez,
ainda não poderá oferecer resposta, mas apenas acompanhar a colheita das
provas orais produzidas pelo autor, oferecendo contraditas ou reperguntando
testemunhas,
Sabemos que na primeira fase procedimental,
a prova dos requisitos definidos no art. 927 do CPC é produzida sumária e exclusivamente
pelo autor (unilateralmente), em face das peculiaridades fáticas que envolvem
as relações possessórias e os ilícitos praticados. A urgência na obtenção da
tutela estatal antecipatória não está na dependência de demonstração de
periculum in mora, mas tão-somente na violação consistente em atos de esbulho
ou turbação, perpetrados pelo réu, capazes de modificar o normal estado
situacional de uso e gozo de um bem da vida, objeto do poder fatual
sócio-econômico exercido pelo demandante.
O sistema normativo foi fiel à tradição que
remonta ao direito romano, além de considerar a importância sócio-econômica do
fenômeno possessório, que requer estabilização no plano do mundo dos fatos
(pela manutenção ou restabelecimento da situação ao status quo ante), razão
pela qual viabilizou a antecipação de tutela interdital, em fase de cognição
sumária, com eficácia provisória, fulcrada em juízo de verossimilhança.
A providência juris-satisfativa, conforme
já expusemos anteriormente, pode ser concedida in limine litis ou após
audiência de justificação. Na primeira hipótese, o réu passa a ter ciência da
decisão concessiva da liminar somente quando recebe a ordem judicial
proibitória, de manutenção ou de reintegração (art. 928 c/ c. art. 932),
enquanto que, na segunda, será "citado" para comparecer à audiência
que for designada, ocasião em que poderá contraditar as testemunhas do autor
ou, se desejar, apresentar reperguntas, apenas para esclarecer pontos obscuros
ou contraditórios dos depoimentos.
Os direitos conferidos ao sujeito passivo
da relação processual, durante o trâmite da audiência de justificação, são
limitados ao acompanhamento dos trabalhos, excluindo-se, portanto, qualquer
possibilidade de arrolar e ouvir testemunhas, nem mesmo requerer o depoimento
pessoal do autor. Significa dizer, que ao réu não é permitido fazer
justificação paralela à do postulante. Aliás, o Código de Processo Civil não
lhe confere essa prerrogativa nem sequer obriga o juiz a ouvi-lo.[21]
Todavia, existem entendimentos divergentes.
Alguns doutrinadores e tribunais assumem posição mais flexível, abrindo um
leque de atuação mais avantajado, permitindo o oferecimento de contraditas e
reperguntas as testemunhas;[22] ou facultando ao magistrado a ouvida das testemunhas
indicadas pelo réu, desde que o julgador entenda necessário;[23] ou, admitindo
o depoimento pessoal do réu;[24] ou, ainda entendimentos mais radicais, que
defendem a tese da obrigatoriedade da ouvida das testemunhas arroladas pelo réu
em fase de justificação.[25]
Antônio Marcato passou a adotar na 7.ª
edição dos seus Procedimentos especiais essa última orientação, seguindo a
linha traçada por alguns pretórios (ao nosso entender equivocada), baseado no
fundamento de que " ... na fase de realização da audiência o réu já se
encontra totalmente integrado ao processo, devendo ser irrestritamente
observada, também em relação a ele, a garantia constitucional do
contraditório." E, em seguida, conclui o ilustre Magistrado paulista:
"Deve o juiz presidente da audiência inquirir as testemunhas apresentadas
pelo réu, tomando o cuidado, no entanto, de evitar que ela se transforme em
verdadeira audiência de instrução e julgamento, cingindo-se ao seu único e
exclusivo fim: a obtenção de elementos de convicção que permitam a concessão da
medida liminar reclamada pelo autor."[26]
Não estamos de acordo com o entendimento do
festejado Professor porquanto no summarissimum possessorium, na primeira fase
procedimental (onde reside a especialidade da forma), o réu não está integrado
totalmente na relação processual, tendo em vista que é "citado" - ou
melhor, intimado - apenas para comparecer à audiência designada (art. 928,
2." parte), onde pode acompanhar todo o ato, contraditar as testemunhas arroladas
e, excepcionalmente, apresentar reperguntas e/ou, se entender necessário,
interpor recurso, oportunamente. Em fase subseqüente é que o Código prevê a
efetiva citação do réu e a sua integração na relação jurídico-processual, com
possibilidade de oferecimento de resposta (art. 930, caput).
Por outro lado, não vislumbramos em termos
práticos, como será realizada a audiência sugerida pelo citado Mestre, sob o
crivo do contraditório, sem que se transforme em verdadeira instrução e
julgamento, em face de que os elementos formadores da convicção do julgador,
neste momento procedimental, são substancialmente de mérito (art. 927),
tratando-se de antecipação juris-satisfativa, no plano fatual, da tutela
possessória (sentença de procedência do pedido).
Por isso, já dissemos alhures, que seria um
despautério, o réu comparecer em juízo para fazer prova oral sem ter
previamente oferecido suas alegações; significa dizer, em outras palavras, que
se admitida a tese contrária, estaremos diante da absurda inversão da produção
de provas pelo sujeito passivo da demanda, antecedente ao oferecimento de
qualquer peça de defesa que contenha as suas alegações e pretensões. "Já a
reinquirição e a contradita não se orientam no sentido de fazer prova favorável
ao réu (prova das alegações do réu), mas no de impedir ou dificultar a
formação de convencimento judicial favorável às alegações do autor."
"A indicação de testemunhas pelo réu
só seria aceitável quando se admitisse um verdadeiro contraditório prévio,
ainda na fase inicial do processo - como se se tratasse do velho summarissimum
possessorium, procedimento em si mesmo completo, se bem que de cognição
não-plena. Esse não foi, contudo, O caminho tomado pelo Código."[27]
Quando a concessão da tutela interdital
opera-se somente ao final com a prolação de sentença de mérito favorável ao
autor, também a execução da medida faz-se de plano, independentemente de
citação do executado, o que inviabiliza a oposição de embargos de retenção nos
moldes do art. 744 do CPC que pressupõe a pendência de um processo executivo
fundado em título judicial (execução por sub-rogação).[28]
Como então equacionar a natureza jurídica
das ações de reintegração de posse de força nova com as regras de direito
material pertinentes à retenção por benfeitorias necessárias e úteis? Para
respondermos a essa indagação havemos de fazer, mesmo que rapidamente, uma
análise crítica da sistemática adotada pelo legislador de 1973, que tomou por
base a teoria eclética das ações, fundada por Liebman, assim como, a
classificação ternária das demandas, com a conseqüente subdivisão das sentenças
proferidas em processo de conhecimento em declaratórias, constitutivas e
condenatórias.
Analisando esse problema do momento
processual oportuno para postular o direito de retenção por benfeitorias nas
ações executivas lato sensu sob a luz do Código de Processo Civil, observa com
propriedade Tercílio Pietroski que o legislador não foi feliz ao permitir o
exercício do direito de retenção apenas às demandas ensejadoras de execução de
sentença específica, deixando de fazer qualquer referência às hipóteses em que
não haverá uma execução de sentença autônoma, mais especificamente nas ações
executivas lato sensu que se afiguram em processos de conhecimento. E pergunta
com agudeza o citado Professor: "Será que o legislador, a exemplo da
doutrina tradicional, tão-só concebeu a classificação trinária de eficácias
sentenciais, desprezando a inegável classificação quinária? Ou será que
desconheceu a existência de ações executivas no processo de
conhecimento?"[29]
Sabe-se que o artífice do Código de 1973
foi o saudoso Professor e Ministro Alfredo Buzaid que, na qualidade de
discípulo ferrenho de Enrico Tullio Liebman incorporou cegamente ao nosso
sistema legislativo a sua teoria baseada na classificação ternária (ou
trinária) das ações, não por desconhecer a classificação quíntupla - defendida
no Brasil, na época, por Pontes de Miranda, dentre outros doutrinadores - mas
sim, por fidelidade à doutrina italiana e por conceber que a executividade e
mandamentalidade das sentenças não ultrapassariam os limites fatuais dos
efeitos da sentença condenatória (consectária do acolhimento de pretensão articulada
em ação condenatória), materializada através da simples expedição de um
mandado judicial[30]. Basta que realizemos uma busca acurada em todos os livros
do Código de Processo Civil que não vamos encontrar qualquer menção ou
admissibilidade expressa da existência, mesmo que fugaz, das ações ditas
mandamentais ou executivas lato sensu.
Sensível a essas e outras deficiências do
atual sistema instrumental notadamente no que concerne à efetividade do
processo -, o "movimento reformista" liderado pelos Ministros Sálvio
de Figueiredo Teixeira e Athos Gusmão Carneiro, tem introduzido cada vez mais
alterações radicais e de fundamental importância para a realização do direito
material, na busca incessante de reduzir o fator "tempo" sem descurar
da segurança matizada pelo due process of law.
Temos presenciado dia a dia em muitas
propostas de reformas para a alteração do Código de Processo Civil (algumas já
introduzidas no Código, V. g. as tutelas antecipatórias genéricas e
específicas) o gradativo desvanecer da tão decantada classificação ternária das
demandas, bem como, o abrandamento da cisão entre cognição e execução e o
prestígio às chamadas ações sincréticas, seguindo a linha de pensamento
ferrenhamente defendida por Ovídio A. Baptista da Silva e Pontes de Miranda.
Prova maior dessa assertiva encontra-se insculpida no 13.º Anteprojeto de
reforma do CPC, sintetizada no tópico precedente deste estudo.
5. Equacionamento do problema e possíveis
soluções
Conforme já assentou orientação o Superior
Tribunal de Justiça, em aresto bem lançado da lavra do Ministro Sálvio de
Figueiredo Teixeira, "Nas ações possessórias, dada a sua natureza
executiva, a posse é mantida ou restituída de plano ao vencedor da demanda,
mediante simples expedição e cumprimento de mandado, sendo inaplicável, em
casos tais, o disposto nos arts. 621 e 744 do CPC. Eventual direito de retenção
deve ser postulado quando do oferecimento de resposta à pretensão possessória
deduzida pela parte contrária, pena de preclusão. A indenização relativa às
benfeitorias, se não pleiteada nos autos da possessória, pode ser reclamada em
via processual específica."[31]
Noutro julgado, desta feita através de
aresto em que foi Relator o Ministro Nilson Naves, a mesma Corte frisou que os
embargos de retenção por benfeitorias não cabem na ação possessória em razão de
sua natureza jurídica, se o direito de retenção não foi anteriormente alegado e
reconhecido. Esse direito há de ser pleiteado na resposta ao pedido
possessório, sob pena de preclusão[32]. Todavia, contrário senso, não se está
a dizer nessa decisão que a oposição tempestiva de exceção fundada em posse de
boa-fé acrescida à feitura de benfeitorias úteis ou necessárias, viabilizará
os embargos de retenção nos moldes definidos no art. 744 do CPC, isto é, em
fase de execução do julgado, tendo em vista que, conforme já dissemos alhures,
a tutela possessória conferida liminarmente ou em sentença definitiva de mérito
não agasalha essa fase processual, diante do seu caráter executivo lato sensu,
variando apenas a interinidade.
Pode-se afirmar, portanto, que a orientação
jurisprudencial firmada é no sentido de que o momento procedimental oportuno
para o requerido de boa-fé nas demandas interditais de força nova ou velha
obter na mesma relação processual a indenização fundada em benfeitorias úteis e
necessárias será através da formulação de pedido contraposto quando do
oferecimento da resposta, notadamente em face do caráter dúplice das ações
possessórias (actio dúplex), ocasião em que deverá o interessado especificar as
benfeitorias realizadas, o seu custo e valor atual, assim como descrever o
estado anterior e atual da coisa e a sua valorização decorrente das
modificações implementadas. Se assim não fizer, o réu incidirá na preclusão e
somente por intermédio de outra ação autônoma é que poderá obter a indenização
pleiteada.[33]
Havemos de dizer que no caso específico dos
embargos de retenção por benfeitorias o problema criado no Código por Buzaid
ainda se agrava mais, à medida que admitiu a oposição somente em processo
execucional de sentença proferida em ação de natureza pessoal ou real, quando
sabemos que, notadamente esta última, reveste-se, via de regra, de
mandamentalidade ou executividade. Nada obstante, haveremos de encontrar uma
solução dentro do próprio sistema posto, sob pena de vir o instrumento a se
sobrepor ao direito material (direito de retenção por benfeitorias), o que
seria ilógico e absurdo.
A única saída encontrada pela doutrina e
tribunais foi permitir ao réu que opusesse a exceção de mérito fundada em
direito de retenção por benfeitorias úteis ou necessárias no exato momento em
que oferecesse resposta, enxertando-a na própria peça contestatória, sob pena
de preclusão. Dessa feita, a efetivação ela ordem judicial no plano dos fatos
através da executividade ficará sempre na condição suspensiva de cumprimento
prévio da obrigação de indenizar, tendo em vista que a sentença de procedência
da reintegração de posse reconhecerá concomitantemente ao réu o direito de
retenção do bem litigioso até a obtenção do ressarcimento através da
indenização postulada e deferida.[34]
Por isso, o direito de retenção deve ser
invocado quando do oferecimento da contestação, sob pena de preclusão. Em não
se procedendo assim, não se incidirá em decadência, mas somente se obterá o
ressarcimento desejado através da propositura de ação autônoma a ser dirigida
contra o vencedor da reintegratória de posse.[35]
Ainda mais grave é o problema verificado
nas hipóteses em que o juiz concede ao autor a tutela li minar de reintegração
de posse initio litis ou após a justificação prévia, ou seja, antes da formação
do crivo do contraditório pela citação e oferecimento de resposta. Nesses
casos, mesmo que o réu seja possuidor de boa-fé e tenha edificado benfeitorias
úteis ou necessárias, perderá o direito de retenção que, aliás, tornou-se agora
juridicamente impossível (ao menos em princípio) em face de o autor ter
recuperado a posse perdida na primeira fase procedimental da ação interdital
de força nova, onde propriamente reside a especialização do rito.
Em outras palavras, inviabilizou-se para O
réu o exercício do direito de retenção por benfeitorias, mesmo que alegue tal
circunstância na peça contestatória e produza prova robusta durante a instrução
do processo, o que será totalmente inócuo para os fins colimados. Resta-lhe
apenas, nessas hipóteses, o direito à indenização através do ajuizamento de
ação ressarcitória autônoma ou tentar obter por intermédio da interposição de
recurso de agravo por instrumento, liminar que modifique a decisão de primeiro
grau e com a conseqüente revogação da medida concedida em seu desfavor.
Em suma, arrematamos com a afirmação que
cabe o exercício do direito de retenção nas ações possessórias de reintegração,
mas não pela forma convencional dos embargos definida no art. 744 do CPC, mas
sim, como exceção de mérito oposta quando do oferecimento da resposta
(contrapedido)[36], ou através do recurso de agravo por instrumento.
Para concluir, se o remédio jurídico exige
do Estado-juiz manifestação urgente em face das peculiaridades da situação
concreta objeto da lide, e, para tanto, o legislador prevê um rito especial ou
tutela antecipatória (v. g. o swnmarissimum possessorium e outras ações sincréticas)
para atender a essas necessidades, não se pode falar em qualquer violação de
princípios; no máximo, o que se verifica, é uma natural limitação angular da
bilateralidade, tendo em vista que a dialética processual, logo em seguida,
estará prestigiada e prontamente estabelecida, a começar pela citação,
oferecimento de resposta, interposição de recursos e todos os demais atos que
caracterizam o contraditório, e, num plano superior, o princípio do devido
processo legal.
Desta feita, inexiste qualquer afronta ao
princípio do contraditório, porquanto a concessão da liminar decorre da
própria natureza da relação fática posta sub examine. Assim, preleciona Ada
Grinover, no sentido de que "Tendo em vista interesses superiores de
justiça, o princípio do contraditório sujeita-se às vezes a certas limitações:
freqüentemente, a ciência dos atos processuais à outra parte e a demora daí
resultante poderiam tornar ineficaz a própria atividade judicial. Por isso,
derroga-se - pelo menos aparentemente - o princípio do contraditório. Mas, como
veremos, na realidade, nesses casos, não há verdadeira exceção ao
contraditório. Essa tomada de posição é universal (...) tais medidas são
sempre provisórias e podem ser ulteriormente reparadas ou modificadas, com
intervenção a posteriori do interessado.
"Não há, portanto, que cogitar-se
sequer da eventual inconstitucionalidade de tais medidas, que na realidade não
representam exceção ao princípio do contraditório: como bem apontou Liebman,
nos casos em que o juiz provê inaudita altera parte, esta pode defender-se
sucessivamente, antes que o provimento ofenda concreta e definitivamente seus
interesses."[37]
Inegável, também, que estamos diante de uma
decisão tomada com base em juízo de verossimilhança e em momento processual de
cognição sumária. Todavia, tal circunstância não nos autoriza a afirmar que o
princípio do contraditório ou da audiência bilateral foi violado.
É bem verdade, a concessão de liminar
inaudita altera parte importa, de certa forma, em ruptura ou limitação dessa
bilateralidade[38], em que pese de maneira efêmera e passageira, porquanto em
momento processual sucessivo, o contraditório instaurar-se-á em toda sua
plenitude, restaurando-se o equilíbrio, a igualdade entre as partes,
garantidos constitucionalmente pelo direito ao devido processo legal (art.
5.°, incs. LIV e LV, da CF).[39]
Em parte, nos dizeres de Oliveira Ascensão,
sacrifica-se o princípio da contraditoriedade de modo a chegar-se rapidamente a
uma composição provisória do litígio, sem prejuízo, evidentemente, da
composição definitiva[40], que resultará de um conhecimento exauriente a ser
realizado na segunda fase do processo interdital.
Ademais, esse princípio deve ser aplicado
em consonância com o tipo de processo, que é responsável pela determinação da
forma e do conteúdo do due process of law[41]. Em outros termos, significa
dizer que o espectro de aplicabilidade do devido processo legal, onde reside o
princípio do contraditório[42], deve estar em sintonia com a ação de direito
material, instrumentalizada pela demanda formalmente deduzida em juízo, onde o
autor articula sua pretensão baseado nas causas de pedir próxima e remota.
6. Análise da questão sob a luz do 13.°
Anteprojeto de reforma do Código de Processo Civil
O 13.° Anteprojeto de Lei de reforma do
Código de Processo Civil apresenta a solução definitiva para o problema
excrescente criado pelo legislador de 1973 no que concerne aos embargos de
retenção por benfeitorias, à medida que altera a localização e redação do art.
744, subtraindo-o do Capítulo II que versa sobre os embargos à execução fundada
em sentença, sistematizando-o, desta feita, no Capítulo III do mesmo Título e
Livro, que trata dos embargos à execução fundada em título extra judicial.
Ainda não satisfeita, a Comissão de Reforma
foi mais além, alterando radicalmente a redação esdrúxula do malsinado art.
744, caput, ao dispor que "na execução para entrega de coisa é lícito ao
devedor deduzir embargos de retenção por benfeitorias."
Assim, os embargos de retenção poderão ser
opostos somente em execução para entrega de coisa fundada em título
extrajudicial (de acordo com a nova redação conferida ao art. 621 do
Anteprojeto), mantendo-se para as demandas que trazem em seu bojo o sincretismo
da cognição com executividade a exceção de direito material do art. 516 do CC
sob a forma de contestação ou, se for O caso, através de impugnação em agravo
por instrumento, nos moldes assinalados no item precedente deste estudo.
A grande novidade, portanto, decorre da
aceitação por parte da doutrina mais lúcida da existência das ações
mandamentais e executivas lato sensu, e, por conseguinte, das tutelas
perseguidas através de ações sincréticas, o que por si só exige do legislador
uma nova postura voltada à redefinição e sistematização de vários institutos
jurídicos do Código de Processo Civil, notadamente a execução (provisória e
definitiva) e as antecipações de tutela, em busca de mecanismos ágeis para a
satisfação das pretensões resistidas ou insatisfeitas dos jurisdicionados e,
num plano metajurídico, da tão decantada paz social.[43]
*Estudo dirigido à homenagem do mestre e
amigo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, líder incansável do atual
movimento reformista do sistema instrumental civil brasileiro, em busca de um
processo mais simples e verdadeiramente efetivo.
[1] “O direito que atormenta". Folha
de São Paulo, de 15.11.1998
Nesse interessante artigo, Francisco Rezek
faz ainda a seguinte observação que merece ser ressaltada: "Quando a
Constituição garante, em qualquer processo, 'ampla defesa, com todos os
recursos a ela inerentes', o leitor de boa-fé supõe que isso é para que ninguém
deixe de provar sua inocência por falta de instrumentos adequados. Não se dá
conta de que, em número muito maior de casos, o que essa regra favorece é a
eternização do processo civil, quase sempre em favor da parte mais forte
(eventualmente o Estado), e o comprometimento do desfecho, ainda que justo,
pela sua demora.
[2] Para aprofundamento sobre o tema v. a
excelente monografia de Ovídio A. Baptista da Silva, intitulada Jurisdição e
execução na tradição romano-canônica. 2. ed. São Paulo: RT, 1997
[3] Curso de direito processual civil. 3.
ed. São Paulo: RT, 1998, v. II, p. J 57-158.
[4] A execução de sentença e a garantia do
devido processo legal. Rio de Janeiro: Aide, 1987. p. 201-202.
[5] Op. cit., p. 253-254.
[6] Ovídio A. Baptista da Silva. Jurisdição
e execução na tradição romano-canônica. 2. ed. p. 190-191
[7] E dificilmente poderia ser diferente,
tendo em vista que regras, princípios e dogmas seculares não poderiam ser
rompidos e absorvidos pela comunidade científica de maneira brusca ou
repentina, fazendo-se mister a atualização gradativa e cautelosa.
[8] Sálvio de Figueiredo Teixeira. As novas
e boas propostas da reforma, n. 11.
[9] Art. 273, § 3.°: "A efetivação da
tutela antecipada observará, conforme sua natureza, as normas previstas nos
arts. 588 e 461, §§ 4.° e 5.° e 461A."
Por Outro lado, preocupa-nos a proposta de
redação apresentada para acrescentar mais um parágrafo ao art. 273, tendo em
vista que, subverte a sistematização das ações acautelatórias e confunde tutela
cautelar com satisfatividade, desprezando a existência de lide nos processos
cautelares e a correspondente existência de relação jurídico-processual
acessória preparatória ou incidental, senão vejamos: "§ 6.° Se o autor, a
título de antecipação de tutela, requerer providências de natureza cautelar,
poderá ser concedida esta, quando presentes os respectivos pressupostos, como
medida incidente da ação ajuizada."
[10] Art. 273, § 2.°: "Não serão
antecipados os efeitos da tutela quando houver perigo de irreversibilidade,
salvo em casos excepcionais em que a sua denegação importe maior dano ao autor
do que benefício ao réu."?
[11] Art. 287. "Se o autor pedir que
seja imposta ao réu a abstenção da prática de um ato, tolerar alguma atividade,
prestar fato ou entregar coisa, poderá requerer comi nação de pena pecuniária
para o caso de descumprimento da sentença ou da decisão antecipatória da tutela
(arts. 461, § 4.°, 461A, 621, 644, 645)."
[12] Art. 461. § 5.°: "Para efetivação
da tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente,
poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias,
tais como, a imposição de multa diária, busca e apreensão, remoção de pessoas e
coisas, desfazimento de obras, impedimento de atividades nocivas, além da
requisição de força policial."
§ 6.°: "O valor da multa poderá ser
modificado pelo juiz, verificado que se tornou insuficiente ou
excessivo."
[13] Art. 461A. "Na ação que tenha por
objeto a entrega de coisa, o juiz concederá a tutela específica, fixando prazo
para o cumprimento da obrigação.
§ 1.º Tratando-se de obrigação para a
entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o credor a
individualizará na petição inicial, quando lhe couber a escolha; cabendo ao
devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.
§ 2.° Não cumprida a obrigação no prazo
estabelecido será expedido, em favor do credor, mandado de busca e apreensão ou
de imissão de posse, conforme se tratar de móvel ou imóvel.
§ 3.° Aplicam-se à ação prevista neste
artigo as disposições constantes dos §§ 1.º a 5.° do artigo anterior."
[14] Art. 520. "A apelação terá
somente efeito devolutivo, ressalvadas as causas relativas ao estado e à
capacidade das pessoas."
Mais completa era a redação do 12.°
Anteprojeto (Base XI!) que previa um parágrafo único (com teor semelhante ao
disposto no art. 283 do CPC italiano) estipulando que "Havendo perigo de
lesão grave e de difícil reparação e sendo relevante a fundamentação, poderá o
juiz, a requerimento do apelante atribuir à apelação, total ou parcialmente,
também o efeito suspensivo, em decisão irrecorrível."
[15] Art. 588. "A execução provisória
da sentença far-se-á do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes
normas:
I - corre por conta e responsabilidade do
exeqüente, que se obriga a reparar os danos que o executado venha a sofrer;
II - não permite, sem a prestação de
caução, o levantamento de depósito em dinheiro ou a prática de atos que
importem alienação do domínio ou dos quais possa resultar grave dano ao
executado;
III - fica sem efeito sobrevindo acórdão
que modifique ou anule a que foi objeto da execução, restituindo-se as partes
ao estado anterior;
IV - eventuais danos serão liquidados no
mesmo processo.
§ 1.º No caso do inc. III, se a sentença
provisoriamente executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente
nessa parte ficará sem efeito a execução.
§ 2.° A caução pode ser dispensada nos
casos de crédito de natureza alimentar em que o exeqüente se encontre em estado
de necessidade."
[16] Art. 621. "O devedor de obrigação
de entrega de coisa certa, constante de título executivo extrajudicial, será
citado para, dentro de 10 (dez) dias, satisfazer a obrigação, seguro o juízo
(art. 737, II), apresentar embargos.
Parágrafo único. O juiz, ao despachar a
inicial, poderá fixar multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação, cujo
valor poderá ser modificado quando se tornar insuficiente ou excessivo."
Art. 627. (...)
§ 1.º "Não constando do título o valor
da coisa, ou sendo impossível a sua avaliação, o credor far-lhe-á a estimativa,
sujeitando-se ao arbitramento judicial.
§ 2.° Serão apuradas em liquidação o valor
da coisa e as perdas e danos."
[17] Art. 644. "As sentenças relativas
a obrigações de fazer ou não fazer executam-se de acordo com o disposto no art.
461 e seus parágrafos, observando-se, subsidiariamente as regras do presente
capítulo."
[18] Art. 3.° "O art. 744 do CPC passa
a integrar o Capítulo m, do Título III do Livro II, com a seguinte redação:
Art. 744. Na execução para a entrega de
coisa é lícito ao devedor deduzir embargos de retenção por benfeitorias."
(...)
[19] Para aprofundamento sobre o tema v. a
nossa obra intitulada Liminares nas ações possessórias, São Paulo: RT, 1995 (2
ed. no prelo).
[20] Em interpretação aos arts. 490 e 491
do CC que dispõem sobre o vício subjetivo da posse (má-fé) temos entendido que
várias são as circunstâncias que fazem presumir que o possuidor ignora que
possui indevidamente, tais como: a) confissão do possuidor de que não tem nem
nunca teve título; b) nulidade manifesta do título; c) existência de elementos
que repugnam a legitimidade da posse; d) a desatenção, o desleixo, a falta de
cautela na feitura da negociação (culpa omissiva); e) o oferecimento de
contestação; f) a citação válida; g) a simples ciência a respeito dos fatos
viciosos; h) a propositura da ação judicial possessória.
O que se deve ter em mente é que o legislador
brasileiro não exigiu prova cabal do conhecimento do vício por parte do réu,
bastando a configuração de circunstâncias que façam presumir essa situação de
fato para que o possuidor venha a perder a característica da boa fé (c[ Joel
Dias Figueira Júnior. Posse e ações possessórias. Fundamentos da posse, n. 7.4.
Curitiba : Juruá, v, I, 1994. p. 256-257).
Nos dizeres precisos do Desembargador
Nilton Macedo Machado, do TJSC, "Para a caracterização da posse de
boa-fé, é essencial que o título de quem a alega não revele o contrário;
cumpre ao julgador analisar os elementos circunstanciais de cada caso concreto,
pois a boa-fé não se encontra no Íntimo do agente, mas na sua projeção externa,
no mundo dos fatos (...)" (ApCiv 42149, JC 73/415. Apud Alexandre de Paul
a, Código de Processo Civil anotado, ar!. 744, p. 3116. 7. ed. São Paulo: RT,
1998).
[21] Lembramos que o revogado Código de
1939 é que facultava ao juiz a ouvida do réu, quando a comprovação dos
requisitos legais à obtenção da liminar fosse feita em audiência de
justificação - par. ún., art. 371.
Assim
também Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil de 1939, p.
321, 1948, e TJSP, RT 135/656.
[22] Cf. Ovídio Baptista da Silva.
Procedimentos especiais, p. 265, Rio de Janeiro: Aide, 1993; Adroaldo Furtado
Fabrício, Comentários ao Código de Processo Civil, n. 374, Rio de Janeiro:
Forense, 1980, v. VIII, t.III, p. 553-555: Nelson Nery Jr, "Interditos
possessórios", RePro, v. 52/177; e Theotonio Negrão, CPC. p. 551, art. 928,
n. 13.5. São Paulo: Saraiva. 1998.
[23] Cf. RT 499/105 e 609/98.
[24] Cf. TACivSP, JTACivSP 63/142 e 64/79.
[25] Cf. RT609/98 e JTA 106/35: TJMS, RJTMS
10/24.
[26] Op. Cit., p. 123.
[27] Adroaldo Furtado Fabrício, op. cit.,
p. 554.
Nesse mesmo diapasão a orientação firmada
pelo 1.° TACivSP ao assinalar que a audiência de justificação de posse é ato
processual cujo objetivo é a complementação, pelo autor, da prova produzida com
a inicial para atuar no convencimento do juiz no sentido da liminar.
Impossibilidade de o réu produzir qualquer tipo de defesa ou contestação,
admitindo-se apenas contraditar, acarear e reinquirir testemunhas do autor, com
garantia do contraditório (RT671/113).
[28] Cf. TJSP, Boletil1l/nfor11lativo LBJ,
n. 117/96, v. 8485. Agln 273815-São Paulo, rel. Des. Benini Cabral. J.
24.04.1996.
No mesmo sentido v. 1.° TACivSP, ApCiv
269379, rel. Juiz Macedo Bittencourt, Rev. For. V. 278/220 (apud Sálvio de
Figueiredo Teixeira, Código de Processo Civil anotado, art. 931, p. 611. 6. ed.
São Paulo: Saraiva, São Paulo, 1996).
[29] A ação de imissão de posse. Rio de
Janeiro: Forense, 1992, p. 97 e RT 648/55. Momento processual para postular
direito de retenção por benfeitorias nas ações executivas falo sensu
[30] A posição de Buzaid, nesse particular,
está patenteada com merídia clareza em sua obra intitulada Mandado de segurança
- Do mandado de segurança individual (São Paulo: Saraiva, 1989), onde defende a
classificação tripartite das ações para esse remédio constitucional,
destinando um capítulo IV) para analisar a natureza jurídica da ação de mandado
de segurança (p. 67-77), onde termina por concluir que o critério para esta
fixação será o pedido formulado pelo impetrante que, dependendo do caso, será
declaratório, constitutivo ou condenatório (p. 75-76). Assinala, ainda, que a
executividade - apesar de não ser de pouca monta - "... ela é apenas um
posterius, do qual o prius é a sentença que reconhece o direito líquido e certo
do seu titular ofendido ou ameaçado por ato ilegal ou de abuso do poder
praticado pela autoridade coatora. Entre um e outro há um nexo de
interdependência não sendo legítimo atribuir ao efeito importância maior do que
à causa que o determinou ... "E, mais adiante arremata: " ... A
mandalidade não é, em conseqüência, um objetivo autônomo apto a criar uma nova
categoria de ação, ao lado da declaratória, constitutiva e condenatória."
(p. 72-73).
[31] REsp 14138-0, MS, unânime, DJU de
29.11.1993, (apud Alexandre de Paula. Código de Processo Civil anotado, art.
744, 7. ed. 1998, p. 3111).
Na mesma linha a orientação do TJSC, em
acórdão bem lançado da lavra do Desembargador Pedro Abreu, cuja ementa assim
leciona: "Para efeito de concessão de liminar, seja inaudita altera pars
ou após justificação prévia, em sede de interditos de reintegração ou de
manutenção, é bastante um juízo de plausibilidade do alegado. já que a decisão
tem caráter de provisoriedade, limitando-se a restabelecer a suposta e provável
posse anterior ao pretenso esbulho ou turbação. As ações possessórias são
procedimentos especiais unitários, englobando numa só relação processual, toda
a atividade jurisdicional, desde a cognição à execução. Daí porque não se
aplicam às ações de manutenção e reintegração de posse as regras pertinentes à
execução forçada e seus embargos, uma vez que não há, nos interditos, instância
executória, posto que a posse é mantida ou restituída, de plano, ao vencedor da
ação, mediante simples expedição de mandado de manutenção ou reintegração.
Assim, tendo o demandado benfeitorias a indenizar, e pretendendo exercer, se
cabível, o direito de retenção, há de fazê-lo na contestação, e nunca por via
de embargos de retenção, após a sentença, porque tais embargos pressupõem a
existência de uma execução de sentença, nos moldes de condenação para a entrega
de coisa certa (art. 744 do CPC)." (Agln 96000001, Trombudo Central, 4.ª
Cam. Cív., unânime, DJE de 24.07. J 996. Bol. de Jurisprudência Bonijuris, n.
277/96, v. 27841, p. 4016).
Em outros termos, "Inviável no âmbito
do cumprimento de liminar possessória a postulação de embargos de retenção por
benfeitorias, que tem incidência apenas na execução para entrega de coisa ou,
ainda, na fase executiva das ações de despejo e de reintegração de posse, desde
que alegada a matéria e provadas na defesa as benfeitorias ensejadoras da
retenção." (cf. TAMG, ApCiv 24.653, rel. Juiz Joaquim Alves).
[32] Cf. STJ, REsp 46218-5, GO, RSTJ v.
75/357-58.
[33] A jurisprudência é farta e
praticamente unânime nesse sentido. A guisa de exemplo, v. 1.º TACivSP, ApCiv
681570-7, rel. Juiz Meio Colombi. ac. un. j. 07.11.1996, RT 741/281; TAMG,
ApCiv 172257-0, rel. Juiz Cruz Quintão, ac. un. j. 26.04.1994, Adcoas de
10.06.1995, n. 147462, TJSP. ApCiv 214360-2, rel. Des. Mohamed Amaro, ac. un.,
j. 10.03.1994, JTJSP 157/53; TJMS, ApCiv 36581-3, rel. Des. Josué de Oliveira,
ac. un. j. 27.06.1995, RJTJMS 107/83; TJDF. ApCiv 32144, rel. Des. Campos
Amaral, Rev. Doutr. Jurisp. 44/374; TJBA, ApCiv 14.932-6, rel. Des. Paulo
Furtado, ac. un., j. 30.08.1994. Adcoas de 10.11.1994 n. 145342 e de
10.04.1995, n. 146867 (apud Alexandre de Paula, Código de Processo Civil
anotado, v. 3, art. 744, 7. ed., J 998. p. 311 1-3125).
[34] Nesse mesmo diapasão o julgado do
TAMG, in verbis: "Reconhecido o direito de retenção por benfeitorias,
inadmissível a execução da sentença prolatada em ação reintegratória, visando à
desocupação do imóvel, até que aquelas sejam indenizadas, configurando-se,
assim, afrontoso a direito líquido e certo o ato judicial que determina a
expedição de mandado de reintegração de posse." (MS 197472-3, rel. Juiz
Ferreira Esteves, ac. un. j. 23.08.1995) (apud Alexandre de Paula, Código de
Processo Civil (Inalado, art. 744, 7. ed., 1998. p. 3119).
[35] Cf. STJ, DJU, de 29.11.1993, rel. Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira (apud Alexandre de Paula, Código de Processo
Civil anotado, art. 744, 7 ed., 1998., p. 31 J I).
[36] Cf. Tercílio Pietroski, op. cit., p.
106; TJRS, ApCiv 593156425, rel. Des. Teixeira Giorgis, RJTJRS, v. 166/327, j.
25.05.1994, ac. uno (Alexandre de Paula, Código de Processo Civil anotado, art.
744, p. 3115).
[37] Ada Pellegrini Grinover. Os princípios
constitucionais e o Código de Processo Civil. São Paulo: José Bushatsky, São
Paulo, 1975. p. 94-96.
Outro não é o entendimento de Nelson Nery
Jr. ao anotar o inc. LV, do art. 5.° da CF: "Mesmo havendo decisão liminar
antecipatória da providência jurisdicional de mérito, isto se dá pela própria
natureza do pedido e não significa ofensa ao contraditório, pois a decisão é
provisória e revogável. Isso ocorre com as possessórias e com a maior parte dos
MS e ACP ... " (CPC, p. 74, art. 5.° da CF, inc. LV, n. 42.3. ed. São
Paulo: RT, 1997).
[38] No mesmo sentido, v. Ovídio Baptista
da Silva, Curso, v. I, p. 67-69. 4. ed. São Paulo: RT, São Paulo, 1998.
[39] Nesse sentido também, v. Arruda Alvim,
ao fazer excelente análise do princípio do contraditório sob a luz do
instituto jurídico da antecipação de tutela (Manual de direito processual
civil. 6. ed. São Paulo: RT, 1997, v. II, p. 390-401.
[40] Direito civil reais. Coimbra :
Coimbra, 1993, p. 112, n. IV.
[41] Nelson Nery Jr., Código de Processo
Civil, p. 73, art. 5.°, inc. LIV da CF, n. 35.
Segundo o festejado Mestre paulista,
"O princípio fundamental do processo civil que entendemos com base sobre
a qual todos os outros se sustentam, é o 'devido processo legal', expressão
oriunda da inglesa 'due process of law." (...) "Em nosso parecer,
bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio 'due process of law'
para que daí decorressem todas as conseqüências processuais que garantiriam
aos litigantes o direito a um processo e uma sentença justos. É, por assim
dizer, o gênero do qual todos os demais princípios constitucionais do processo
são espécies.
"Assim é que a doutrina diz, por
exemplo, serem manifestações do 'devido processo legal' o princípio da
publicidade dos atos processuais, a impossibilidade de utilizar-se em juízo
prova obtida por meio ilícito, assim como o postulado do juiz natural,
contraditório e do procedimento regular." (Princípios do processo civil na
Constituição Federal). São Paulo: RT. 1992, p. 25-26, n. 3.
[42] Na lição de Carlos Alberto de
Oliveira, "O contraditório constitui, sem dúvida, elemento essencial ao
fenômeno processual, especialmente pela imprescindível participação dos
interessados no 'inter' de formação do provimento destinado a interferir em sua
esfera jurídica." (RePro 7317. "O juiz e o princípio do
contraditório").
[43] Parece-nos que a solução para o
problema da efetividade do processo civil contemporâneo reside na
admissibilidade e paulatino incremento das ações sincréticas em nosso sistema
instrumental codificado. Parafraseando o festejado Mestre Ovídio A. Baptista da
Silva em assertiva lançada durante o Curso de Atualização em Direito sobre
Tutelas de Urgência auspiciado pelo Instituto de Ciências Jurídicas, na cidade
de Blumenau/SC em novembro do ano transato, "a reforma do CPC poderia
resumir-se num único dispositivo: Instituem-se as ações sincréticas e revoga-se
o processo de conhecimento.