Retorno pós doutoramento
DISCURSO DE RETORNO ÀS ATIVIDADES JUDICANTES APÓS A CONCLUSÃO DO CURSO DE PÓS-DOUTORADO [1]
Excelentíssimo
Senhor Presidente deste egrégio Tribunal de Justiça, Desembargador Cláudio
Barreto Dutra.
Senhoras
e Senhores Desembargadores, Procurador Geral de Justiça, Senhores Advogados e
Serventuários.
Antes de
iniciar a minha fala, gostaria de saudar com efusão, os eminentes pares que
tomaram posse durante a minha ausência do País – Desembargadores Paulo Roberto
Sartorato, Tulio Pinheiro, Carlos Alberto Civinski, Ronaldo Moritz Martins da
Silva, Ricardo Roesler e Robson Luz Varella.
Saibam,
Srs. Desembargadores, que para mim e, certamente para todos nós, é motivo de
grande honra tê-los integrando esta egrégia Corte de Justiça.
Recebam,
pois, os meus calorosos cumprimentos.
Senhor
Presidente, ao retornar as minhas atividades judicantes, penso que, por dever
de lealdade para com todos os presentes, mister se faz proferir algumas
palavras acerca do período em que estive ausente para realização do meu Pós-doutoramento
em Direito Processual Civil, na Università
Degli Studi di Firenze, pelo período de um ano, compreendido entre os meses
de setembro de 2011 a setembro de 2012.
A
primeira é de reconhecimento e gratidão pela oportunidade ímpar que me foi concedida,
por maioria expressiva, de poder viver por um ano na cidade que é berço esplêndido
do Renascimento, da cultura, das luzes, terra de Dante Alighieri, Michelangelo
Buonarroti, Leonardo Da Vinci, Sandro Boticelli (Alessandro Filipepi), Nocolò
Machiavelli, Giovanni Boccaccio, dentre
tantos outros.
E, o que é mais importante, permitiu-me realizar
meus estudos e pesquisa numa das mais reconhecidas e antigas universidades da
Europa e do mundo, fundada em 1321 - a Universidade dos Estudos de Florença – Faculdade de Direito de Mario Draghi (hoje presidente do Banco CentralEuropeu),
Antonio Cassesse (Direito Internacional Público – 1º Presidente do Tribunal
Penal Para a Ex-Iuguslavia e o 1º Presidente do Tribunal Internacional Para o
Libano), Vincenzo Vigoritti (Dir. Comparado), Vincenzo Varano (Dir. Comparado) Paolo
Grossi (Const. e atual presidente da Corte Cost. It); Paolo Cappellini (Reitor e Prof., de Hist. do
Direito), Remo Capone (Dir. Proc. Civ) e Nicolò Trocker (este último, processualista e comparatista, sucessor da cátedra
de Mauro Cappelletti). Como se não
bastasse, trata-se da Faculdade que já teve em seu quadro docentes do quilate
de Piero Calamandrei, Mauro Cappelletti
e Andrea Proto Pisani, dentre outros.
Nesse
período, frequentei o curso completo de Direito Processual Civil., ministrado pelo Prof. Remo Capone ( 100 h/a), de
Teoria Geral do Processo (60 h/a) e Direito Processual Civil Europeu Comparado
(60 h/a), ministrado pelo Prof. Nicolò Trocker, além dos diversos contatos e
orientações recebidas pelo Prof. Andrea Proto Pisani que, nada obstante já
encontrar-se aposentado, ainda mantém sua sala no Departamento de Dir.
Processual Civil, frequentando a Universidade onde recebe com muita atenção e
fidalguia os colegas professores, alunos da graduação, doutorandos e
pós-doutorandos para orientação.
O
Departamento concedeu-me uma sala reservada para estudos, sala idêntica aos dos
demais professores, com toda a estrutura necessária, além de livre e especial
acesso a fotocopiadora, fax, computadores e a Biblioteca Piero Calamandrei
(bilbioteca de estudo dirigido da Faculdade de Direito) e a Biblioteca do
Centro de Ciências, onde pude acessar obras valiosíssimas e todos os escritos
de Mauro Cappelletti, por ele doados à biblioteca da UNIFI.
Por
indicação do Prof. Remo Capone, passei a integrar um grupo paraestatal
denominado Osservatorio della Giustizia
Civile – grupo regional Toscano,[1]
formado por professores, magistrados, advogados e sociólogos que, voluntariamente, estudam os
problemas da jurisdição italiana, em confronto com a jurisdição europea, em
busca de soluções para a minimização dos crises por ele vivenciadas, com base
em dados estatísticos e estudos doutrinários científicos, encontros realizados
em média quinzenalmente em Firenze, bem como participei de seu conclave
nacional, em maio desta ano, em Catania.
Participei de dois cursos de 180 horas
destinados à formação de mediadores, organizados e coordenados pela
Universidade de Firenze(Prof.
Remo Capone, Paula Lucarelli e Ilaria Pagni) e ministrados em sua sede, por professores
da casa e convidados, com formação em psicologia, comunicação, ciência jurídica
e com larga experiência na área da mediação civil, tudo em sintonia com a
Diretiva 52/2008 do Parlamento Europeu e Conselho de Estado sobre a mediação e
da legislação italiana acerca da matéria (Decreto legislativo 28/2010 que
dispõe sobre a mediação e Decreto Ministerial 180/2010 atinente a formação de
mediadores).
Participei
no ano passado de Congresso Nacional de Direito Processual organizado pelo
Instituto de Direito Processual Italiano, na Universidade de Urbino e, neste
ano, em Congresso Internacional de Direito Processual, na Universidade de Bari,
em homenagem ao Prof. Franco Cipriani e, em Roma, sobre Arbitragem Nacional e
Internacional.
Participei
também dos seguintes conclaves jurídicos: 1) La Mediazione civile e commerciale – Una formazione specialistica I
conflitti nel settore della responsabilità sanitaria (ILARIA PAGNI, LUCIANA
BREGGIA, LUCA MINITTI, PAOLO CREA, GIAN A. NORELLI, VITTORIO VERDONE -
29-3-12); 2) Tecniche di Mediazione
di secondo Livello - Le controversie in materia di locazione, comodato, affitto
di azienda e condominio – Primi problemi applicativi e novità dal marzo di
quest’ anno - SERGIO PAPARO – LAURA RISTORI - 14-5-12); 3) La mediazione come tecnica di risoluzione
dei confliti – Corso di perfezionamento - Introduzione – Alle origini della
mediazione: filosofia, diritto et etica nella gestione del conflitto; La mediazione nel quadro normativo – La
normativa nazionale, comunitaria e internazionale; La mediazione fra tipi, modelli e metodi:
come scegliere; Tipologia delle
controversie e analisi del conflitto: mediazione e negoziazione nei settori
delle relazioni sociali: Il compito del
mediatore: fra tecniche e principi; Il ruolo del professionista in mediazione –
esercitazioni con la partecipazione dei discenti; La mediazione: gli esiti, il
verbale di fallita conciliazione, la proposta del mediatore - esercitazioni con la partecipazione dei
discenti; Il verbale di conciliazione – esercitazione con la partecipazione dei
discenti (Direzione scientifica: REMO CAPONI, PAOLA LUCARELLI , ILARIA PAGNI -
PROFF. GIOVANNI COSI – ILARIA PAGNI – REMO CAPONI – PAOLA LUCARELLI – LAURA
RISTORI – ADRIANA CAPOZZOLI - CARLO U.
MASTELLONE – FAZIO SEGANTINI – MARCO MARINARO - 10, 11, 17, 18, 24 e 29 de
maio); 4) Dottorato in Scienze
Giuridiche - Lezione: La costituzione come fonte direttamente applicabile dal
giudice (REMO CAPONI - 11-5-12); 5) Encontro multidisciplinar: Mediazione –
vivere nella crisi- percorsi creativi e processi inclusivi, promovido pela
Organização Toscana Concilia (Firenze,
Biblioteca Delle Oblate - 12 de
maio); 6) Convegno conclusivo
del ciclo di lezioni del Dottorato in Scienze Giuridiche - La costituzione come
fonte direttamente applicabile dal giudice (GIUSEPPE VETTORI – ENZO CHELI –
ELISABETTA LAMARQUE – XAVIER ARBOS – MARTA BERTOLINO – ALESSANDRO PIOGGIA –
CHRISTOPH BUSCH – FILIPPO VALGUARNERA - 18-5-12); 7) The new ICC Rules on Arbitration and ADR - Conferenza – Corso di
Diritto Commerciale (JOSEFA
SICARD-MIRABAL - 21-5-12); 8) Differences and similarities in the U.S. approach and European approach
to international arbitration - Conferenza – Corso Dottorato di Ricerca in
Scienze Giuridiche – Discipline Civilistiche (JOSEFA SICARD-MIRABAL -
22-5-12); 9) Congresso Nacional
degli Osservatori sulla giustizia civile (Catania, 26 e 27 de maio); 10) Diritti e Coesione Sociale: il dialogo con
la magistratura e le professioni - Istituto Italiano di Scienze Umane - Il
sistema di soluzione dei conflitti: giurisdizione e mediazione (LUCIANA BREGGIA – MONICA BROGI –
MANUELA CECCHI – LAURA CAPACCI – MARIA COSTANTINI – DEBORA RAVENNA); La formazione congiunta (PAOLO CAPPELLINI – GAETANO PACCHI – ANGELICA
SCOZIA – MARINA CAPPONI); Il ruolo dell’
avvocatura e il modello italiano (GAETANO VICICONTE – ROBERTO RUSSO –
ENRICO MARRAPESE - ELENA ZAZZARI – CARLO
POLI - 9-6-12).
Igualmente, frequentei o Tribunale de Firenze (Forum), participando de diversas audiências cíveis conduzidas pelos
juizes de primeiro grau, Doutores Luca Minniti e Luciana Breggia, bem como a
diversas sessões cíveis de julgamento na Corte
d`Appello di Firenze (Corte de Justiça Toscana), acompanhando os
julgamentos em Camera di Consiglio, notadamente
em casos de ressarcimento de danos ajuizados contra o Estado Italiano em face
da desarrazoada duração do processo*, junto a
Primeira Sezione Civile da mencionada
Corte, sob a Presidencia do Juiz Giulio di Simone. Nessas e em diversas outras
oportunidades, analisei detidamente diversos processos acerca do aludido tema.
Fiz também visita ao Presidente da Corte
d`Appello da Toscana, Juiz Fabio M. Drago.
Frequentei também a biblioteca do European
University Institute, situado nas colinas
fiorentinas, a Fiesole, a fim de complementar minhas pesquisas.
Concentrei minhas pesquisas em três temas
centrais: Arbitragem e jurisdição (complementando e aprofundando os meus
estudos já realiadosem
tese de doutoramento); Autocomposição civil e responsabilidade civil do estado
em face da morosidade da justiça.
Tive
a honra de ver mais uma vez os meus estudos serem citados por doutrinadores
estrangeiros – desta feita pelo Prof. Giovanni Bonato, da Università degli Studi di Roma – La Sapienza, em obra intitulada
“La Natura e gli effetti Del lodo arbitrale – studio di diritto italiano e
comparato”, Ed. Jovene, 2012.
É
uma alegria e uma honra Srs. Desembargadores, encontrar reconhecimento e
destaque no mundo acadêmico europeu e acolhida em tribunais estrangeiros, com
elevada respeitabilidade.
Mas
saibam Srs. Desembargadores, que essa empreitada está longe, muito longe de ser
fácil ou mero deleite ou recreio; para lá chegar, foi preciso passar por diversas
e difíceis etapas de estudo - especialização na Università Degli Studi di Milano, mestrado e doutorado – estes dois
últimos títulos obtidos com a nota máxima, com distinção e louvor, na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Prof. Arruda Alvim,
cuja dissertação e tese foram publicadas pela Ed. Revista dos Tribunais,
contribuição que procurei oferecer aos estudiosos e profissionais do direito
sobre as liminares nas ações possessórias,
e arbitragem, jurisdição e execução.
É
uma longa e difícil jornada, Srs. Desembargadores. E, depois de tudo isso,
ainda passamos pelo crivo da aceitação de ingresso numa das mais conceituadas e
tradicionais Universidades da Europa, onde procuramos nos estabelecer e obter
reconhecimento dos ilustres professores que lá se encontram.
Enganam-se
ou procuram enganar-se, os que pensam (e felizmente são poucos) que os juízes que
se afastam da jurisdição para aprimorar seus conhecimentos, vivem prazerosas
férias. Prazerosas oportunidades sim, mas férias não!
Por
certo, esses colegas não conseguem avaliar a dificuldade da tomada de decisão,
a mudança radical de vida, o afastamento dos familiares, dos entes queridos, do
aconchego e do conforto do lar.
Diria
o Poeta Vinicios de Moraes: “É preciso ter peito, peito de remador” para
enfrentar essa longa jornada ...
Trocamos
as nossas casas por um minúsculo apartamento, enfrentamos longas filas na
polícia de imigração para conseguirmos, depois de muitas idas e vindas, obter a
nossa permissão de permanência no país (visto no Brasil e permissão no
exterior).
Precisamos
cuidar sozinhos de tudo, dos estudos, das roupas, do supermercado, da comida e
não descurar da família que deixamos no Brasil.
Soma-se
a saudade de todos, do nosso cotidiano, dos nossos filhos, parentes e amigos.
Saibam
pois, estimados Pares, que essa decisão importa em transmudação radical de
vida. Lá fora, deixamos de ser Desembargadores e cidadãos brasileiros em solo
brasileiro. Lá, somos mais um extracomunitário que precisa encontrar um pequeno
apartamento para morar e somar suas despesas àquelas deixadas em seu pais de
origem. Precisamos pegar trem e correr até o ponto para não perder o ônibus que
parte para universidade.
Por
outro lado, esses estudos revertem em proveito e aprimoramento de nossos
julgados, somando-se à contribuição doutrinaria que oferecemos à ciência e
profissionais do Direito, além da nossa participação na Escola da Magistratura
e na Academia Judicial.
Trata-se,
portanto, de um investimento que representa significativo retorno ao
Judiciário, aos jurisdicionados e a academia como um todo.
Por
último, assinalo que deixei meus processos em dia antes de partir, tendo julgado
nos primeiros sete meses de 2011 nada menos do que 1061 feitos, e, nesta data,
possuo um acervo de apenas 793 processos, dos quais somente 14 são de 2009 e já
estão todos pautados todos, exceto alguns que se encontram em diligência; resta
apenas uma cervo de 39 processos de 2010, 341 de 2011 e 394 de 2012.
Nossas
metas foram atingidas, graças a participação e dedicação dos prezados colegas
que me substituíram, em especial a Dra. Cinthia Bittencourt Shaefer, Drs. Saul
Steil, Gilberto de Oliveira e Gerson Cherem II, sem os quais, não manteríamos a
nossa produtividade em prol dos jurisdicionados.
Agradeço
ao Des. Claudio Dutra, por reconhecer o nosso esforço pessoal e preocupação com
a tutela jurisdicional, designando permanentemente magistrados abnegados e
competentes para prosseguirem com os julgamentos dos processos a mim confiados.
Agradeço
também a minha competente e dedicada equipe de trabalho que deu toda a
sustentação e apoio aos eminentes Desembargadores Substitutos para que bem pudessem atender aos
nossos processos.
Por
último, agradeço a compreensão do presidente de minha Câmara, Des. Carlos Prudêncio,
e de nossa ilustre e permanente colaboradora, Desa. Denise Volpato, sem o que
também não conseguiria concluir com tranquilidade o meu intento acadêmico.
Obrigado
a todos e contem sempre comigo.